Cunha Couto

Gestor de Crises

Privatização da guerra: solução ou agravamento de crises?

CCBlog 121

Mercenários sempre estiveram nas guerras.

Em versão moderna, EUA e Rússia, por exemplo, vêm se valendo de contratos com empresas militares privadas (EMP) que lhes vendem todo e qualquer serviço para guerra, como ocorreu na Síria, no Iraque e no atual conflito na Ucrânia.

Quando professor da Facamp (Faculdades de Campinas), orientei alunos sobre o tema das EMP para seus trabalhos de conclusão de curso, em vista dos impactos presentes em suas atividades para as relações entre Estados.

Claramente, nas últimas décadas, tem-se visto emergir um novo ator internacional no que diz respeito à segurança dos Estados: as EMP, que, ao serem contratadas, vão contra a ideia de que os Estados devem recorrer às suas Forças Armadas (FFAA) para se defenderem. Quando é interessante ao Estado, as EMP o substituem…

Não por acaso, as EMP têm crescido tanto em sua atuação quanto em seu escopo, realizando atividades antes de exclusividade das FFAA, e, com isso, alterando regras e criando variáveis na interação entre Estados.

Por muitas vezes os governos têm achado conveniente transferir algumas de suas responsabilidades públicas ao setor privado, seja por conta dos custos ou pela eficiência, qualidade e mudanças nas concepções. Foi assim que se chegou à quebra do controle estatal da violência pelas EMP.

Há pouco tempo, o Grupo Wagner, uma EMP muito atuante em guerras na África, foi manchete internacional pela marcha de protesto em direção a Moscou que, além de contida pelos russos, teve seu líder Prigozhin morto, em explosão na aeronave em que viajava.

Fala-se de várias dessas empresas atuando por ambos os lados no conflito na Ucrânia, com contratos de vendas de serviços que vão desde mão de obra e treinamentos a fornecimento de armas e munições.

É nesses contratos que fica mais bem exposta a diferença no emprego entre as FFAA e as EMP: o corpo do soldado morto no campo de batalha precisa ser trazido de volta ao seu país; o do mercenário não.

Há, claro, a obediência das EMP aos comandos militares do país contratante, mas ocorre que aquelas empresas não se vinculam às leis tradicionais e acreditam que podem agir sem restrições e afrontar a ética da guerra.

Portanto, já passa da hora de termos um fórum para discutir o papel das EMP nos conflitos.

Entretanto, diante destes comentários, acreditam que EUA e Rússia renunciarão a grupos mercenários?

A revolta de mercenários – não na Rússia, mas no Rio de Janeiro

Não foram só os mercenários do Grupo Wagner, na Rússia, que fizeram protesto e agiram contra o Estado que contratou seus serviços. O mesmo ocorreu no Brasil.

Essa revolta constitui-se numa sublevação militar ocorrida no Brasil, sob o governo de D. Pedro I, em 1828..

Episódio pouco conhecido na História do Brasil, inscreve-se no contexto da guerra contra as Províncias Unidas do Rio Prata (1825-1828), da qual resultou a independência da República Oriental do Uruguai (27 de Agosto de 1828).

O motim iniciou-se em 9 de junho e durou três dias. Neste período, a população da Corte  (cidade do Rio de Janeiro) viveu sobressaltada pela sublevação de três batalhões do Corpo de Estrangeiros (alemães, irlandeses e italianos) que serviam ao Império do Brasil desde a Independência (1822).

A origem da revolta foi um boato de que dois alemães haviam sido mortos por soldados de um batalhão brasileiro.

Para reprimir essa sedição foi necessário, além das tropas regulares e da Guarda Real de Polícia, o auxílio da população (cerca de 1000 paisanos armados, entre os quais havia estrangeiros, 50 frades e mais de 100 padres e estudantes). O governo solicitou ainda ajuda às forças tarefas francesa e inglesa, aportadas na capital, que desembarcaram 400 marujos ingleses para guardar o Palácio de São Cristóvão, mais 600 franceses que se concentraram perto do Arsenal de Guerra.

Nos combates morreram cerca de 240 mercenários e mais de 300 ficaram. Do lado oposto, 120 mortos e 180 feridos.

Os batalhões de tropas de mercenários foram dissolvidos e a maior parte de seus integrantes, deportada. Os que restaram e mereceram, foram alocados no exército brasileiro como soldados de baixa patente a serviço dos duques e barões da época.

Essa História se repetiu, agora em 2023 na Rússia, como farsa?

Facebook
Twitter
LinkedIn
Pinterest

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *