Cunha Couto

Gestor de Crises

A dimensão internacional das crises

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Realmente, rara será uma crise que não apresente um componente internacional. Se não o estamos visualizando, o nosso estudo não estará completo.

Um bom exemplo é o da primeira greve nacional de caminhoneiros, em 2000. Havia ocorrido uma greve assim na França e, logo depois, uma na nossa vizinha Argentina. Nossos caminhoneiros, no comércio Mercosul, conheceram a força desse movimento e, num domingo, panfletaram os postos de descanso de nossos caminhoneiros. Na segunda-feira, todo o transporte estava paralisado!

Foi um grande aprendizado. A partir daí, adotamos uma escala geográfica mínima de acompanhamento de temas que tinham potencial de crise para a nossa sociedade.

Se vamos, por exemplo, estudar a questão indígena no Brasil, a escala tem que ser o arco indígena de toda a América do Sul.

Também expandimos a escala de acompanhamento nas ocasiões em que articulamos Assistência Humanitária Internacional, que congregava mais de uma dezena de Ministérios com atuação nessa área – terremotos, tsunamis, erupção de vulcões e outros, onde brasileiros necessitavam de ajuda.

Fatos como esses deram nova dimensão à ação política externa brasileira, pela postura proativa diante dessas crises.

Com a pandemia da Covid-19, perdemos oportunidade de nos destacarmos em cooperação internacional ao, como exemplo, não propormos uma atuação conjunta com os países nossos vizinhos? Ou numa cooperação Argentina – Uruguai – Brasil no combate à praga de gafanhotos que se espalhou, em 2020/21, na Argentina, em nossa fronteira?

Fato é que, em uma pandemia como a da Covid-19, assim como em ameaças de nuvem de gafanhotos ou de grandes crises financeiras, sempre existirá uma dimensão internacional global e uma demanda por cooperação entre os países, pois todos eles têm que adotar medidas especiais, em proveito das seguranças sanitária ou financeira mundial.

E como vemos o Brasil, hoje, neste contexto internacional? Como lidarmos, por exemplo, com a pressão internacional por uma agenda ambiental?

De fora do país, mas também internamente, são cobradas ações concretas para que o desmatamento na nossa Amazônia e no nosso cerrado caia a cerca de zero. Efetivamente, há um consenso internacional da importância da persistência pela busca de boas práticas ambientais e sociais.

Para reduzir os impactos no mundo dessas questões que, juntamente às pandemias, se tornaram universais, surgem pressões pelos investidores internacionais junto ao governo.

Portanto, como consequência interna, as questões ambientais, os desdobramentos das mudanças climáticas, o surgimento de pandemias e as suas consequências geram tal ordem de pressões e exigem tal ordem de respostas pelo Brasil que, pela primeira vez, estes temas foram incluídos na revisão de nossa Política Nacional de Defesa.

Acredito que tenha ficado claro que raros serão os casos de tema doméstico sem reflexo externo ou de tema internacional sem repercussão interna. Um tema com potencial de gerar alguma crise só estará, portanto, bem analisado se forem vistos tanto o seu impacto internacional quanto o nacional.

Como, então, evitar pensar apenas em escala local ou nacional? Só se fizermos um esforço para transcender os 8,5 milhões de quilômetros quadrados de nosso território. Ou ampliamos a moldura geográfica do nosso pensar ou não entenderemos o mundo que nos cerca.

Deixo-lhe, por fim, pensar na sua resposta a uma inquietação: uma crise internacional terá impacto na cidade que você habita?

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