Cunha Couto

Gestor de Crises

A crise diplomática Brasil-Israel

CCBlog 148

Este é mais um exemplo da importância da comunicação nas crises. É na comunicação que, muitas vezes, os governos têm problemas. E falhas na comunicação comprometem, e muito, o gerenciamento de crises!

Cabe destacar que, nas relações de poder entre os países, compete à diplomacia a primazia na aplicação da estratégia de persuasão, em que as ideias opostas são confrontadas, mas com o emprego da racionalidade nessa relação.

Entretanto, nesse contexto, deve-se considerar que, em uma crise, não existem informações completas. Isso é um mito e uma dificuldade para os comunicadores, fazendo com que aí seja onde o governo se torna mais vulnerável.

A notícia de uma comparação que o presidente Lula fez da situação enfrentada pelos palestinos em Gaza com a vivida pelos judeus na 2ª Guerra Mundial gerou grande discussão, interna e externamente, no Brasil. A crise escalou rapidamente, a ponto de o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, responder duramente à manifestação, por rede social, feita pelo chanceler israelense, Israel Katz, contra o presidente Lula, seguindo-se, por ambos os lados, a convocação de embaixadores para explicações.

Aparentemente, pela primeira vez se estava valendo das redes sociais (mais informais e midiáticas), em vez dos canais oficiais e da imprensa, numa crise entre Estados, deixando claro que a “Diplomacia Digital” é inevitável.

Uma vez mais, para uma crise, basta uma palavra! Não pelo que é dito pelo governo, mas pelo que é entendido ou percebido pelo outro, levando a uma reação que não fora assim desenhada.

A experiência brasileira – e a de outros países – mostra que a comunicação atua em uma arena onde, com mais frequência, o governo vê perdidos os melhores e mais exitosos esforços de gerenciamento de crise.

Obviamente, uma excelente comunicação não é suficiente para “mascarar” um gerenciamento de crise inepto. Por outro lado, um bom gerenciamento facilita enormemente a comunicação social. Em verdade, as experiências pelas quais passamos por 13 anos no Gabinete de Crises da Presidência da República terminam por nos mostrar que não é possível nem desejável separar “gerenciamento de crise” da “comunicação”… Ambas as atividades são partes indissolúveis de um mesmo exercício.

Em suma, a cada dia, neste nosso mundo de comunicações instantâneas e de massa, tornam-se quase sinônimos a “comunicação” e o “gerenciamento de crise”, pois a comunicação tanto informa ou traduz um pensamento quanto afeta o comportamento dos atores no correr da crise… Uma função dupla. Essa recente crise Brasil-Israel nos mostra o quanto se vem tornando mais complexa a tarefa de comunicação no gerenciamento de crise. Vejamos alguns aspectos dessa complexidade:

É claro que não se pode discutir a justiça da existência do Estado de Israel; e que não se pode apontar Israel como culpado ou genocida; mas talvez sim um governo, que metade de Israel desaprova? Das discussões havidas, nos resultou que o Holocausto não pertence a nenhum governo ou partido e cobre também os milhões de mortos não judeus: russos, armênios, chineses, filipinos, coreanos etc.? Em meio a tanta complexidade, o que implica a palavra “genocídio”? A extinção do “genos” – família, tribo, clã, e por extensão povo? Portanto, o processo todo é muito complexo, e assim é a comunicação resultante, refletindo a cada vez maior complexidade das crises…, mas tem que haver uma possibilidade de entendimento. Brasil e Israel têm relação histórica de amizade e respeito. Certamente, atritos serão superados com o tempo. De forma pragmática, deixo-lhes interessante conselho dado pelo jornalista Otávio Guedes: não usem as palavras “Hitler” e “judeu” na mesma frase…

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