Em meio à crise Hamas-Israel, o sucesso dos resgates de brasileiros da área de conflito, transportados de volta ao Brasil por aeronaves da Força Aérea Brasileira (FAB), é uma ótima notícia em meio a tanto sofrimento.
Para muitos, a repatriação significou felicidade.
Pode parecer uma operação simples, mas cada uma dessas operações envolve outras três ou quatro, também com planejamento e execução premidos pelo tempo.
É muito difícil precisar quantos brasileiros residem ou estão viajando no exterior. Essa diáspora de brasileiros é estimada (porque muitos estão irregulares nos países) em cerca de três milhões a cinco milhões de pessoas, das quais, segundo o Ministério das Relações Exteriores (MRE), 14 mil residem em Israel e 6 mil na Faixa de Gaza.
Assim sendo, em todo caso de conflito bélico ou de catástrofe natural, podem existir brasileiros em necessidade de serem retirados de quase todas as regiões do planeta.
Por isso, salvar brasileiros que estejam em risco no exterior é assumido, pelo nosso Governo, como um comprometimento moral.
Em atendimento à opinião pública, que vê como essencial o resgate de brasileiros em momento de perigo no exterior, as embaixadas possuem planos de evacuação, em geral preparados pelos adidos militares. Como regra geral, a “retirada” é operação coordenada pela área consular do Itamaraty, utilizando meios militares de transporte.
Resgate de brasileiros na Guerra do Líbano
Em 2006, o então Gabinete de Crises da Presidência da República foi ativado para apoiar o MRE (ou “Itamaraty”) para a chamada “evacuação de não combatentes” brasileiros no Líbano.
A Guerra do Líbano de 2006 foi um episódio do conflito militar árabe-israelense, ocorrido no norte de Israel e no sul do Líbano, com início no dia 12 de julho, envolvendo as Forças de Defesa israelenses, o braço armado do Hizbollah e, em menor grau, o Exército libanês.
Somente um mês depois, no dia 11 de agosto, foi aprovada a Resolução 1701 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que determinava, entre outros pontos, a cessação das hostilidades, a retirada das tropas israelenses do território libanês, o desarmamento do Hizbollah e o reforço das forças armadas libanesas por uma força armada internacional (UNIFIL), para guardar a fronteira, no sul do Líbano, inclusive a marítima, pela primeira vez. A resolução foi acatada por ambas as partes.
Essa operação de resgate partiu de um levantamento pelo nosso Consulado de onde estavam os brasileiros e quais queriam ser retirados. Seguiu-se uma negociação para o trânsito de alguns ônibus, ostentando a bandeira do Brasil, por um corredor humanitário até o aeroporto em Beirute, devendo ali chegarem em determinado horário, que era uma janela de tempo concedida a aeronaves para pousarem e, em minutos seguintes, decolarem. O destino foi a Turquia, de acordo com a negociação. Tudo foi realizado de forma sigilosa.
Nesse momento, a FAB estava em processo de substituição de seus aviões de transporte, de forma que foi necessário mobilizar aeronaves de nossas companhias aéreas.
Manual de Operações de Evacuação
Um ano depois, Portaria Normativa do Ministério da Defesa (MD), de 11 de outubro de 2007, aprovou o “Manual de Operações de Evacuação de Não-Combatentes”, que definiu que essas operações são conduzidas pelo MD, por solicitação do MRE, para evacuação de não-combatentes, cujas vidas estejam em perigo, de seus locais no país anfitrião para um local de destino seguro.
Ainda por essa Portaria, o embaixador do Brasil no país anfitrião é a autoridade que normalmente requisitará a evacuação ao MRE, sendo, ainda, o responsável pela condução do Plano de Emergência de Embaixadas e pela segurança dos evacuados, até a chegada do componente militar que realizará as operações de evacuação, caracterizadas pela incerteza.
Em certo momento do nosso Gabinete de Crises, foi aventado a necessidade de serem retirados os brasileiros de Timor Leste. Diante das dificuldades logísticas de operar no outro lado do Mundo, o Governo australiano se ofereceu para, se necessário, evacuar os brasileiros para a cidade de Darwin, de onde seriam reencaminhados para o Brasil pela FAB.
Nunca foi necessário aceitar esta ajuda, mas a partir desse momento sempre houve uma instrução, não escrita, de que os meios brasileiros de transporte, em futuras evacuações, também dariam prioridade aos cidadãos australianos.
Portanto, repetimos, para cada operação de evacuação de não-combatentes realizada, três ou quatro outras operações foram objeto de alguma forma de planejamento e preparação, sempre de forma sigilosa.