Cunha Couto

Gestor de Crises

Como um gabinete de crises se desvencilha das amarras burocráticas?

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Sempre nos indagavam, em vista da pressão por uma solução rápida, como um gabinete de crise, assessorando nas práticas decisórias de uma Presidência, se desvencilhava da burocracia presente nas engrenagens da estrutura formal.

Três aspectos merecem ser sublinhados.

Em primeiro lugar, um gabinete de crise nunca deve se “autoconvocar”. A sua entrada em funcionamento para gerenciar uma crise precisa ser fruto de decisão do presidente, seja ele do Executivo ou de uma empresa. Isso porque o presidente, ao convocar o gabinete, abre canal especial de comunicação (e por vezes de comando) com os que tratam da crise. Ou seja, de certo modo, um “curto-circuito” burocrático é criado para contornar os inevitáveis atrasos dos procedimentos usuais.

Por outro lado, é claro que, na medida em que o gabinete conta com a participação de todos os órgãos ou setores interessados em resolver a crise, criam-se caminhos alternativos para lidar com ela. E, não menos importante, por contar com funcionários graduados dos mais diversos setores que lidam com crise, o gabinete mantém linhas informais de comunicação e de articulação, capazes de cruzar todas as fronteiras da burocracia.

Como lição aprendida, o formato clássico dos organogramas reflete o que, nos países de língua inglesa, é denominada a “teoria da chaminé”: cada órgão nunca mantém contato com outros que não façam parte, como uma chaminé, de suas linhas verticais de comando e informação, indo de encontro aos esforços de articulação.

Como exemplo, cabe recordar um momento em que foi moda realizar protestos em pontes que cruzavam a fronteira. De madrugada, um grupo de manifestantes se colocou no meio da ponte que liga o Brasil ao Uruguai. Com o correr do dia, funcionários brasileiros, em sucessivos momentos, informaram seus superiores de tal manifestação. Às cindo da manhã foram os funcionários da Receita Federal que levaram ao conhecimento de seus superiores a informação sobre a manifestação. Uma hora mais tarde, a sede da Polícia Federal em Brasília recebia idêntico informe. Um militar aposentado, de passagem pela cabeça da ponte, viu a manifestação e telefonou para dar conhecimento do assunto ao Comando da Região. Em síntese, quando o “gabinete de crise” reuniu-se para lidar como problema, às 14:00 horas, ficou claro que cada um dos dez órgãos interessados havia sido informado em diferentes horas sobre a manifestação, mas, seguindo a “regra da chaminé”, nenhum deu conhecimento do assunto às demais instituições envolvidas.

Na prática, para o gabinete de crise conseguir escapar das regras da chaminé e, com a rapidez dos caminhos não ortodoxos, socializar as informações sobre determinado problema, deve se valer do fato de os integrantes participarem dos encontros sobre outras crises. Por conseguinte, fica facilitada, pelo conhecimento pessoal, a difusão das informações. Os fluxos informais ainda têm a vantagem de não necessariamente refletir as posições oficiais de cada órgão, ou seja, há mais liberdade para que os servidores expressem suas opiniões próprias.

Em suma, um bom gabinete de crise, integrado com funcionários de várias origens, pode dar velocidade e inteligência à governança, tantas vezes reprimida pelas regras das chaminés.

Um terceiro aspecto diz respeito ao fato de que as diversas origens profissionais dos integrantes do gabinete de crise fazem com que não haja, de antemão, verdades acima de qualquer escrutínio. Não apenas a diversidade dos integrantes garante uma massa maior de informações retiradas dos órgãos de origem, mas o conhecimento disponível termina por ser filtrado por múltiplas experiências corporativas. Em breves palavras, o que o gabinete sabe tende a ser um conhecimento mais livre de preconceitos.

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