É no acompanhamento pós-crise que estão os processos de “cicatrização”. Depois de encerrada uma crise, há que se corrigir suas causas e se preparar para como ocorrerá a próxima.
É a fase em que se põe na mesa o que se aprendeu com a crise, as experiências que foram acumuladas e se concretizam as janelas de oportunidade.
Em 2001, as regiões Centro-Oeste, Nordeste e Sudeste passaram por uma crise de oferta de energia elétrica, devido ao anormalmente baixo nível de água dos reservatórios responsáveis pela geração de eletricidade nessas regiões.
A drástica queda de oferta de chuvas se deveu ao fenômeno La Niña (queda da temperatura no oceano Pacífico, que faz reduzir as chuvas no Centro e no Sul do Brasil) que se fez mais sentida na região SE, onde estão armazenadas boa parte das águas geradoras de energia.
Para enfrentar essa crise e evitar o colapso no abastecimento,a estratégia foi a de se implementar cortes programados para reduzir o consumo de energia no país.
O Gabinete de Crises da Presidência existia há apenas dois anos quando foi chamado para duas tarefas, integrando a Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica (coordenada pela Casa Civil):
§ articular com órgãos e setores prestadores de serviços essenciais (saúde; segurança; etc) ações que mitigassem os impactos negativos de corte programado de energia elétrica; e
§ acompanhar de perto o comportamento dos níveis dos reservatórios das usinas hidrelétricas, por região, e com esses dados fazer a simulação de quanto de energia armazenada e afluente ainda restavam.
Estas ações, iniciadas em junho de 2001, duraram oito meses, e se conseguiu deixar atividades essenciais (definidas por Comitê Técnico coordenado pelo Gabinete de Crises) de fora de racionamentos.
Finda a crise, levantaram-se suas principais causas estruturais e de gestão (ummea culpa governamental): a má gestão do uso dos reservatórios de água, erros na execução da política energética e deficiências na geração e na transmissão de energia.
A mitigação para uma próxima crise, então, passou pela aquisição de termoelétricas (apesar do alto custo financeiro e ambiental) e pelo incentivo às fontes alternativas de energia, o que reduziu o impacto de nova crise energética havida em 2015, essa já em situação diferente da vivenciada em 2001.
A crise hídrica é problema crônico? Tão dependente de meteorologia?
Vinte anos depois do “apagão de 2001”, estivemos com o La Niña se fazendo presente, e eis-nos em nova crise hídrica, a maior em 91 anos.
E ainda pior, isso ocorreu quando a nossa atividade econômica mostrava sinais de recuperação, devido à Covid-19, demandando, portanto, mais energia.
Por que o quadro foi diferente de 2001, quando a energia vinda das hidrelétricas correspondia a 90% do total gerado? Porque, com as medidas de pós-crise, essa energia caiu abaixo de 70% do total, com as novas fontes, como o gás para as usinas térmicas, a solar, a eólica e a biomassa.
O que fazer no pós-crise de 2021 para garantir a segurança energética?
Devido à nossa matriz energética, há sempre que se armazenar mais água. Isso se faz possível melhor administrando a vazão dos reservatórios, reduzindo as perdas excessivas de água potável, incentivando fontes alternativas de energia e adotando medidas de proteção ambiental e climática.
Também devemos rever a rede de termoelétricas, contingente, mas ainda responsável pela quarta parte da potência instalada, mantendo só as eficientes e eficazes, com prioridade para as a gás.
Seria o caso de ampliarmos a energia nuclear no sistema?
Fundamental, ainda, é buscar o apoio da sociedade, que teria na racionalização do uso da água e da energia a melhor solução.
São janelas de oportunidades que se abrem… Se não forem aproveitadas, teremos que recorrer aos pajés para os rituais da chuva.