Nos EUA, a lógica de neutralidade deu lugar à de projeção de poder?
Há 90 anos, em 31 de agosto de 1935, o Congresso dos Estados Unidos aprovou a primeira Lei de Neutralidade. O texto, motivado pelo desejo de evitar a repetição do envolvimento na Primeira Guerra Mundial, estabelecia a proibição da exportação de armas, munições e equipamentos bélicos para países em conflito. Tratava-se de uma tentativa de blindar o país diante das tensões que já cresciam na Europa e na Ásia, em um cenário que desembocaria, poucos anos depois, na Segunda Guerra Mundial.
Novas versões da lei foram sendo adaptadas nos anos seguintes, mas todas tinham como essência a ideia de que a venda de armamentos a nações em guerra poderia arrastar os EUA para disputas externas. Esse espírito de neutralidade foi, entretanto, gradualmente flexibilizado. Com a ascensão do nazismo e do fascismo, Washington percebeu que a restrição de armas favorecia tanto os agressores quanto as vítimas, o que levou a mudanças que culminaram na política de “empréstimo e arrendamento” de 1941, apoiando os Aliados.
Hoje, quase um século depois, a realidade é oposta. Os Estados Unidos figuram como os maiores exportadores de armas do mundo, responsáveis por cerca de 40% do mercado global. Em meio à guerra da Ucrânia, às tensões em Taiwan e aos conflitos no Oriente Médio, o país não apenas vende, mas também doa armamentos a seus aliados. A lógica de neutralidade deu lugar à de projeção de poder e à manutenção de alianças estratégicas.
Portanto, a comparação entre 1935 e 2025 revela uma mudança profunda: de uma tentativa de se afastar da guerra para a escolha consciente de alimentar e sustentar conflitos por meio de suas indústrias bélicas. O que antes era uma política de contenção tornou-se instrumento de influência geopolítica. Cabe perguntar se, em longo prazo, essa estratégia garantirá mais segurança ou se apenas perpetuará um ciclo de dependência e instabilidade mundial.