São duas disrupções globais de naturezas distintas, mas ambas com impacto em todo o planeta. A década de 2020 começou com dois grandes choques que abalaram a ordem econômica mundial: a pandemia de Covid-19 e a ofensiva tarifária do governo Trump contra parceiros comerciais estratégicos, especialmente a China. Embora tenham origens diversas — uma crise sanitária e outra geopolítica —, ambos provocaram rupturas profundas nas cadeias de suprimento, redefiniram o papel dos Estados na economia global e estimularam movimentos nacionalistas e protecionistas.
O tarifaço promovido por Trump marcou o rompimento com os princípios do livre-comércio que haviam orientado a globalização desde a década de 1990. Por meio de aumentos tarifários unilaterais, os Estados Unidos impuseram barreiras a produtos estrangeiros, justificando as medidas pela necessidade de proteger sua indústria, corrigir déficits comerciais e garantir a segurança nacional. Essa postura desencadeou uma guerra comercial, elevou custos em escala mundial e forçou empresas a repensar suas estratégias de fornecimento. Governos, por sua vez, enfrentaram pressões para redefinir seus alinhamentos políticos e comerciais.
A pandemia, por sua vez, paralisou a economia global de forma abrupta: fronteiras foram fechadas, o transporte internacional foi interrompido e fábricas se viram obrigadas a parar. O efeito mais duradouro, porém, foi o questionamento sobre a dependência de cadeias produtivas excessivamente dispersas. Países e companhias passaram a valorizar fornecedores geográfica e politicamente próximos, buscando reduzir vulnerabilidades futuras.
Ambos os eventos expuseram a fragilidade da globalização tal como concebida nas últimas décadas. Se o tarifaço demonstrou que o comércio pode ser instrumentalizado politicamente, a pandemia revelou o alto custo de uma interdependência extrema.
Na minha avaliação, o mundo caminha para uma nova etapa da globalização, moldada por um equilíbrio mais delicado entre cooperação internacional e soberania nacional. O tarifaço foi um grito político; a pandemia, um alerta sistêmico. Ignorar essas lições seria um erro grave, assim como resistir às mudanças. O desafio será encontrar o ponto de equilíbrio — tarefa complexa para governos nas próximas décadas e para cada um de nós, responsáveis por conduzir nossas vidas sob o princípio do amor.