As lições de Talleyrand: o zelo que se torna insignificante.
Em tempos de crise econômica, é comum que governos recorram a medidas drásticas, muitas vezes revestidas de um discurso patriótico. No Brasil, a recente elevação de tarifas de importação dos EUA — apelidada de “tarifaço” — reacendeu debates sobre protecionismo, competitividade e os riscos de medidas excessivas.
Para iluminar essa discussão, vale recorrer à sabedoria de Charles-Maurice de Talleyrand-Périgord (1754–1838), o diplomata francês que atravessou revoluções e impérios com notável pragmatismo.
Talleyrand, que preferia a diplomacia sutil ao confronto direto, deixou frases memoráveis que permanecem atuais.
Uma delas, “Surtout, pas trop de zèle” (“Sobretudo, evitar o excesso de zelo”), parece ter sido feita sob medida para a crise atual. A imposição generalizada de tarifas elevadas pode, paradoxalmente, sufocar a economia como um todo, até em escala global, ao encarecer insumos, frear a produtividade e afastar investimentos.
A segunda citação do diplomata, “Tout ce qui est excessif est insignifiant” (“Tudo em demasia é insignificante”), amplia esse raciocínio. Quando uma política pública se excede — seja no escopo, na intensidade ou na retórica —, ela perde sua eficácia e credibilidade. Foi o que se viu no governo de Donald Trump, nos Estados Unidos, quando a adoção de tarifas punitivas contra a China, embora inicialmente eficaz em pressionar negociações, acabou prejudicando agricultores americanos, encarecendo produtos e não revertendo a balança comercial de forma substancial. O “America First” resultou, muitas vezes, em “America Alone”.
A lição de Talleyrand é, portanto, clara e deveria ser levada a sério: medidas econômicas não podem ser motivadas apenas por zelo ideológico ou pressões momentâneas. O excesso, por mais bem-intencionado, tende à irrelevância — e, muitas vezes, ao desastre. O verdadeiro patriotismo econômico se expressa não no fechamento de fronteiras comerciais, mas na abertura de caminhos para a competitividade sustentável. E, como diria o diplomata francês, um pouco menos de zelo seria, neste caso, sinal de maturidade.